sexta-feira, 22 de março de 2024

Caixa-Preta

Tenho medo de me tornar
Tudo aquilo que eu desprezo
E estou chegando lá
Eu sou o medo que tenho
De mim, do meu corpo
Do subsolo da minha mente, do tapete
Onde eu escondo as coisas
Que não quero enxergar
Os muros que eu montei
Em construção atípica
Montes de cascalhos derramados
Acumulando-se até cobrir a vista
Se tornaram altos demais
Para que eu os pudesse atravessar
Se eu tentasse
Caminhar sobre os cacos de conchas
Distribuídos ao redor de tudo 
que eu consigo ver
Meus pés ficariam dilacerados
Não sei se ainda teria pés
E então, qual afinal
Seria o propósito de ir até depois do muro?
E ficar presa diante dele
Observando de longe o que possa ter do outro lado...?
Acho que meu muro tem uma razão de ser
Um alçapão com motivo
Com direção e propósito
Como tudo sempre fez sentido
Enquanto eu o construía
Mas eu costumava forrar caminhos para o meu trânsito
Em dias chuvosos
Em dias raros
Em dias em que o brilho das pedras
Refletia a luz daquilo que me mata
E delas eu conseguia tirar alguma beleza
Mas então algo deu errado
Eu não me lembro o que causou o desmoronamento
Eu não me lembro o que fez com que todos os caminhos se apagassem nos entulhos
Talvez porque as memórias tenham ficado presas nos escombros
E eu não tenho coragem de tentar buscá-las
Eu tentei muito
Venho tentado
Até perceber que
Havia algo muito terrível
Escondido debaixo das pedras
E me veio o pensamento de que
Talvez eu não devesse libertar
O que quer que esteja vivendo por lá
Soterrado 
na poeira da guerra
do meu passado
Eu não entendo como esperam que eu prossiga
Que espécie de vida eu teria
Sem meus membros
Com um monstro à minha sombra
Com metade do meu sangue no chão sob meus pés
Eu não entendo como esperam
Que eu encontre uma saída
Uma maneira
De acreditar que ainda existe vida
Se tudo que eu posso ver com esses meus olhos exaustos
É a neblina
Do que um futuro deveria ser
Do que a realidade deveria ser
Eu não sei se eu estou de fato aqui.
Eu não sei se eu quero estar...
Eu tenho medo
De me odiar ainda mais do que tenho me odiado
Durante toda a minha vida
De sofrer por isso
De me machucar
Os ecos dos meus pensamentos são meu terror noturno
Eu sou meu próprio algoz
Eu tenho medo
Sobretudo eu tenho medo de morrer
Ao contrário do que tenho dito
Tenho muito
Muito muito
Muito medo de morrer
E talvez por isso
Há tantos anos
Venho desejando
Que a morte aconteça logo
Tento ser corajosa
Se eu enfrentasse de uma vez
Talvez
Talvez eu não tivesse mais medo.


segunda-feira, 4 de março de 2024

SDV

I cum to any sign of affection
Like I'm made of absence and water
I try to hydrate myself
Like I'm a dry tailed mermaid
Cooking inside a mattress' box
And then I pull my hair away
Push myself against the ice
And towards the unknown 
Into expectancy
I'm always alone
What do you want from me?
What do I want from thee?
The poem dies as soon as it gets born
This isn't how love is supposed to look like
I never met any sort of affection at all
I pray to Ioba and hope not to die yet
Not just yet
It's not even year 2

domingo, 3 de março de 2024

Vermelho

Eu descobri que gosto do cheiro de água
E que talvez eu seja um Iéti
Eu descobri que flores podem ser como socos
E silêncios podem ser a maior arma
Que alguém tem pra te tolher
Eu descobri que tenho pânico
De ver meu sangue escorrendo
Pra fora de mim
Ao contrário do que eu esperava
Ao contrário do que eu pensava desejar
Descobri que não estou morta, ainda
Que posso ser divertida
Pensei que estava muito velha
Com a alma a cacos
Mas parece que ainda me resta vida
E eu queria muito menos
Do que eu acreditava querer
Ao que parece eu tenho vivido sempre
Com o mínimo
Menos que o mínimo
E não resta espaço pra ouvir
Meus próprios sentimentos
Descobri que
Gosto muito de vermelho
Escondi que era uma cor que eu amava
No rosa, no amarelo
Todo o ódio que eu carrego camuflado
Não sei dizer se vermelho simboliza amor
Talvez seja como flores
Meus ossos estão deteriorados
Ou a capa deles
Algo que me doi
Descobri que ainda consigo
Aprender coisas
E talvez assim
Se eu continuar escrevendo
Buscando ar
E me resfriando à noite
Eu consiga continuar de pé

quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Confetti

My pee smells like sugar
I drink soda like my life depends on it
'Cause it feels like it does
And then I spent
An entire night
Wondering
If this is my last day on Earth
Trying to shush my chest
Helplessly
Pointlessly
Because the sun rises and I'm
Still tachycardic
But at least my migraines has been 
Frozen away
I guess
At least
At least
The tiniest of victories
Has to be a win too
Otherwise
Otherwise...
I try to breathe
I try to distract myself from the reloading
Memory effect
Of suffocating out of air
Like a fish caught on a net
Like a baby fish
Because for some reason
I feel like I'm three
No, two
Two and a half
Always the half
I feel tiny
Like the rest of my body is no longer there
Only my heart
Beating
And beating
And BEATING
To explosion
Bursting out of my rib cage
Crushing my chest bones
Into horrible pieces
Leaving me to dust
Like the rest of a dead mermaid
I feel dry
As if I was made of water
And water is being drained out of my body
I try to wet my face
My body
My mouth
I swallow half a bottle of water
The big one, that rests next to my crib
And it feels like someone left me
On a fuckin' desert
I'm about to loose it
I almost get a little thankful
For my life is slipping away from me
But my body won't let me go at peace
I feel dirtsick, nauseous
Dizzy and disoriented
I feel pain
It's taking too long for me to die
And I hate it
I wanted it to be quick
I should have just done it myself.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

4D Travel

I don't even know you
I wanted to be someone that you admire
I am so helpless
Feel like those lonely old ladies that I pity
I wanna be a child
I don't even know you
But I want yout kindness
I want it for me
Ain't it selfish?
To wish for someone to be yours
Only yours
But I don't know if I want you to be only mine
I just wanna be yours
But I don't know you
Let's suppose in a distant future
Play pretend with me
Just for a second
Let's suppose that I, eventually
End up belonging to you
Let's imagine for this moment
How would it be
Well I can't 
'Cause I don't know you
How would you act?
Who would you be?
I don't even know who you are,
For real
To be honest
I don't even know why
I wanna be yours
Or wish you to be mine
I guess I can only feel
You have this ability
Of making one feel nice
And I wanna feel nice
I wanna be treated good by you
But this is an addiction 
This isn't love
Isn't affection
Isn't friendship
Or even being gentle
My empathy consists
On a desperate attempt
To be well treated
To feel happy
And who are you,
Beyond a complete stranger,
To make me feel happy?
Me, the miserable one
The unforgiven, the helpless,
The naufragee 
The sinking figure
Lost within myself
Far from anyone's reach
Far from the understanding
Of who you may be
Only able to see
My own projections
As the water mirrors me?
Nothing is real,
I know that much
At least not in my mind
Among my distorted universe
My multiversed perception
Atemporary
Back and forwards 
Nothing stands
For all stands
Time is not a reasonable concept anymore
How could any sort of romance
Fit in that dismantled sense
Of existence?

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Zombie

Eu não me lembro
Quando foi que os pedaços de mim
começaram a rachar
Quando foi exatamente
Quando começou
Se começou
Será que um dia vocês me deixaram crescer?
Ser?
Me tornar
Algo, alguém
Um pedaço, um grão de qualquer coisa
Um pó
Uma ideia que fosse
Uma onda-partícula
Uma tentativa
Eu não me lembro de um dia
Ter me sentido uma pessoa
Uma pessoa completa
Incompleta
Humana
Não-alien
Não-objeto
Não-robô
Carne, osso, sangue
Eu sempre senti como se
Meu corpo fosse um excesso
Com nojo das minhas entranhas
Dos meus cheiros, da minha pele
Dos meus fios de cabelo
Tudo sempre pareceu pesar sobre mim
E eu sempre me perguntei
Onde ficava o eu
Por baixo desse peso
Que percebia isso
Que sentia a morte me devorando aos poucos
Cada vez que eu via a luz do sol
Cada vez que vocês me notavam
E onde ficava a dor
De cada vez que vocês não me notavam
Porque se esse corpo não era meu
Então onde ficava o dentro que parecia dilacerado?
Se eu continuava inteira
E não via sangue
Se nada fazia sentido
Se ninguém notava que eu estava morrendo
Que parte de mim estava desintegrando
Lentamente
Como eu
Como meu tempo de perceber o mundo
Talvez não estivesse bem conectada
Talvez não sobrasse energia
Pra notar o que quer que fosse
Talvez morrer seja assim
Não conseguir notar a realidade
Eu ainda me pergunto o que é
Se existe alguma realidade
Eu nunca estive em uma
Ou
Não me recordo
Eu não me lembro de mim
Mas
Me lembro de vocês
De vocês
De vocês
De vocês
De vocês.
Invadindo a minha mente
Engolindo todos os meus pensamentos
Me invadindo como vento
Como um gás intoxicante tomando o lugar
Do oxigênio
Do qual eu precisava
Pra respirar
Talvez eu tenha ficado deformada
Com a radiação
Eu me lembro de tudo que 
Vocês plantaram em mim
E cresceu
Cresceu
Cresceu
Como ervas daninhas,
Eu devia ser um adubo muito bom
Afinal eu estava apodrecendo
E quanto mais eu virava essa massa
E meu cérebro se derretia
Eu me tornava alimento
Pra vocês parasitarem melhor
E sobreviver melhor
Num mundo que eu nunca conheci
Talvez eu tenha sido tão danificada
Que não sobrou nada
Nenhum registro do que foi feito
Do que um dia eu poderia ter sido
Se é que isso existiu
Eu acho que eu nunca tive chance
Vocês nem sabem que
Talvez um dia eu teria existido
Nunca notaram, se importaram
E o silêncio que vocês sem nenhum esforço
Derramaram em mim
Afogaram em mim
E usaram pra me esmagar como fosse Uma grande mansão
Um lindo jardim que vocês regavam distraídamente
Decoravam
E riam
E riam
E riam
Como se nunca tivessem gritado
E explodido meus tímpanos
Como se eu nunca estivesse estado ali
E eu não estive
Então quem gravou essas memórias?
Quem serviu pra anotar tudo sobre
Quem vocês eram?
Eu preferia estar enterrada
Do que ter virado isso 
Do que seguir me arrastando
Fingindo que ainda tem algo
Dentro do meu corpo
Quando eu sou só o resto de vocês
E do que fizeram comigo
O silêncio
É assolador
Doi mais que teria doído
Ser espancada
Até que todos os meus ossos fossem quebrados
Às vezes desejo
Sentir como teria sido
Se em vez do silêncio
Eu só ouvisse as mãos
Ou pedaços de coisas
Ou rodas de um carro passando por cima de mim
Talvez um dia eu descubra
Talvez não mude nada pra vocês
Haha
E tudo que eu consigo pensar
É no que seria pra vocês
Vocês
Eu não sou ninguém
Mesmo
Vocês me criaram pra isso

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Lolita — Vladimir Nabokov

Capítulo 1

Lolita, luz de minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama. Lo-li-ta: a ponta da língua descendo em três saltos pelo céu da boca para tropeçar de leve, no terceiro, contra os dentes. Lo. Li. Ta. 

Pela manhã ela era Lô, não mais que Lô, com seu metro e quarenta e sete de altura e calçando uma única meia soquete. Era Lola ao vestir os jeans desbotados. Era Dolly na escola. Era Dolores sobre a linha pontilhada. Mas em meus braços sempre foi Lolita.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Tantalum Oxide

You saw on me a victim
That you could easily play
And that's how you win it, ain't it?
Saying exactly what you think
I don't expect to hear
You wanted to affect me
But I easily forget it
It was never you whom I cared about
And you knew it
I was only obsessed over 
the compliments you gave me
And you wanted me to be obsessed
Because it wasn't healthy
And you like it unhealthy
I know you do, you don't have to lie to me
I'm a human lie detector
But I quite enjoy a well played lie
A nice built-up fantasy
I know you like the love-bombing too
I am such a mirror, did you know?
Did you like that in me?
That I'd roleplay you, while we fuck?
Did you enjoy the time
You spent around yourself?
Before realizing you had dark secrets
Hidden in the back of your mind
That you despise?

I know you're not coming back
And if you do,
It's now too late
Your gameplay was quick
It got me bored
I'm not even scared, I'm just annoyed
I have one rule
An unbreakable one
You cannot leave me alone
'Cause if you do
I'll go back on mirroring myself
And I'll turn back into something
That you'd always hate
Because I'm not a meetable person
I live in a distant planet
You turned me into him
And all I did was use you to pretend
That I had forgotten
All the trauma that he caused me
But he was one of many
He is just a symbol
And so are you
And I am not a person
I'm an abstract perception of being
A blur in the space
A shadow
Something that your eyes
Would never comprehend
Words that your mouth
Could never pronounce 

I am too far beyond your reach

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

Inflammable

Safe and sound in the cold dark room
I hide under a blanket pretending
That I'm not underdressed

My burning captor, disguised under shadows
Waiting to hunt me,
Making his act, mocking my filthiness
He doesn't even know me
He doesn't even care

My sorrows,
My panics,
My broken minded kinks,
My twisted desires,
My loneliness,
The deep dark hole he left on my heart
And somewhere else
Where my "no" was swallowed
Like many many others
Of course he wasn't the first

I grew up being taught
How to dance to be a puppet
How would I fight back?
I belonged to him 
And still
Within all the rage
I have left in my heart
I still wish to be loved

Beyond the murder
And torture
That my bones nourish
And water
And I try to keep caged
But no longer wish to,
Beyond the fuck among my mess
The rock under the soil,
The petroleum
The magma that tights me up together 
My glue
Is the crave to still be loved
Not just a pleasure
A date
A kiss
A look
Love
Deep and unsimple
Death threatening
Joyful
Love.


sábado, 23 de dezembro de 2023

Fire Pit

My room is a mess
My mind is a mess
My life is a mess
My heart is a mess
My mess belongs to you.

I feel withdrawal symptoms
And a voice inside my head
Whispers
That you're not coming back to me
Ever again
Not once more
I'm gonna see you
Your pretty hair
Your cute cheeks

I don't wanna loose you
But maybe that's how it's supposed to be
I don't recall being so stupid
So ignorant, so romantic
So pathetic and childish 
I don't recall being so easily violent
So controlling
But I guess this dirtyness lives in me
I am the monster's habitat
And to keep it warm,
I have to do some sacrifices 
Break a neck or two
Spread some blood on the floor
Explore the depths of the fall.

I love you.
I feel you far far far away from me.
And I'm terrified this will go away.
I need to stay.

I need to lay my soul on you
To even have a chance
To see the sun
To keep warm
In the freezing summer of this coast
When you're not here
I'm left alone
And it feels as bad as is good
When you slip through my ears
To caress my eardrums
I need to be yours
I crave it
I breathe you
All of my thoughts
Rest inside of you

I am your bed,
Your blanket
And the second between you try to stay awake
But fall apart over my arms
I am the electricity
On the point of your fingers
When you touch me
In the middle of the night
You are the blank page
Where I want to write the poems
I didn't write yet
I hope you never go.