sábado, 20 de julho de 2024

Do 23° andar

Faz tempo que não tenho um diário.
Que não rabisco, que não desenho
Que não escrevo poemas à mão
Ou não perco folhas importantes.
Faz tempo q eu não coloro meu livrinho
Com minhas canetinhas
Pacientemente, até o fim
Que não fico feliz com o resultado
Com o desenvolvimento,
Com a percepção de ser um novo eu.
Por que eu tenho medo
De me ver sobre um papel?
São 5 da manhã e que vontade que eu sinto
De começar um diário novo.
De escrever e rabiscar e desenhar
E listar no papel todas as minhas importâncias
Todas as minhas vielas
E o que se acumula entre elas
Eu penso que estou deitada
Que não é hora
Que estou cansada 
Nada disso me impediria no passado
Mas algo me engole no processo
Tudo que eu consigo pensar é
Em como desejo fechar meus dois olhos
E ir pra um mundo onde eu sei que alguém me abraça
Mesmo que seja o diabo
Mesmo que seja uma cobra
Ou um escorpião
Eu desejo fugir dessa realidade
Antes que eu nela invista
Mais uma vez
Meu tempo
Meu corpo
Minha energia 
Minha vontade de viver 
Tão escassa quanto
As lagartixas que aparecem aqui em casa
Pra me visitar
E me socorrer.
Não sei explicar
Qual é o sentimento
De me sentir sendo devorada
Por alguma coisa sem nome e sem cor
Que me desintegra os nervos
De fora pra dentro
Que eu me sinto mastigada
Como um choque leve
Leve demais pra ser tolerável
Não sei explicar como é
Me sentir morrendo 
Escorrendo 
Por entre meus dedos
Desabando sobre mim
Mas sentir a morte
Mais forte que tudo
Mais real que o sol
Muda você.
Tatear o seu próprio fim
De novo e de novo
Sentir o gosto nos ossos
Saber o que é não mais existir,
Isso muda você.
Não dá pra fingir que nunca aconteceu.
Eu vivo com medo
De desabar neste mesmo buraco
Sinto que sei demais
E não consigo parar de procurar
De cutucar
No buraco do vespeiro
É uma força que vai além de mim
Me carrega com ela
E me derruba
No abismo sem fim do ser
Ou do deixar de ser.
Tenho medo de mexer com meus dedos dos pés
E abrir os olhos 
De sentir a pele
Porque acho que quando eu notar
Eu já estarei caindo lá de cima
Eu já estarei no meio do caminho.

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