quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Gafanhoto

Quatro horas da manhã
Hoje você não falou comigo
Eu sinto o perigo queimando
A ponta da minha língua
Desde minha pele gritando
Por atenção
Ao medo de que meus pensamentos
Sejam virados ao avesso
E eu seja excluída de todos os ambientes
Acendo um isqueiro e
Ponho um cigarro na boca
Me lembro de milhares de coisas que vivi
Como se em vez de memórias
Fossem um filme que eu assisti
Há muito tempo
Me lembro da sensação e
Me vejo em terceira pessoa
Eu sou uma estranha a mim mesma
Queria pintar meu cabelo de verde
Verde-limão
Ou rosa
Rosa avermelhado
Sempre um dos dois
Nunca me decido
Queria arrancar meu cabelo
E com ele a percepção de identidade
Eu não me conheço
Não me reconheço
O espelho me humilha
Ri da minha cara
Me ameaça
Me diz pra voltar pra casa
Esse jogo não é pra mim
Eu tenho medo
De ter um corpo
De punhá-lo na rua
De me expulsar de casa,
De mim
Da minha cabeça
Acho que tá vindo aí uma enxaqueca
Meus dentes pedem socorro
De tão mastigados
Não sei quando eu comecei a fazer isso
Hoje mordi meu dedo
Tentando arrancar pedaço
Mas quando percebi que já não sentia mais a dor
Desisti da força 
Me assustou
Eu costumava ser corajosa
Eu tenho medo de tudo
Que é consequência de uma interação 
Sinto que meu futuro está escrito
E é ser devorada viva
Por humanos
Talvez eu seja um gato
Ou um gafanhoto
Que coberto por chocolate, dizem
É uma delícia de engolir
Talvez eu só sirva mesmo
Para ser servida
Em uma bandeja grande com tempero e molho
Defumada de nicotina.

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