sexta-feira, 22 de maio de 2015

A água ferveu, de novo

Vou por teu texto para cozinhar
Porque é assim que textos nascem,
Eles cozinham
E eu vou esperar
Com toda a paciência do mundo
O forno apitar
Pra me avisar que está pronto

No fundo o despertador sou eu que aciono

Aí, eu vou perceber
Que me enrolei mais uma vez na tua teia
Carregada de purpurina
De todas as cores
Conheço uma criança que teria adorado

Nada disso é digno de texto

Ninguém sabe que as vozes
Que escrevem em itálico
Coexistem comigo
E não são eu

Mas nós existimos

Vou me distrair
Enquanto tento borbulhar
O corrosivo molho de tomate
Que dá alguma graça pro macarrão

Talvez assim,
Se eu conseguir engolir a raiva
E meu estômago fizer a digestão
Talvez eu esteja curada

Você consegue fazer melhor que isso

Não, eu não consigo,
Eu não posso, não posso
Não, não, não

O que é que você está fazendo?

Eu não sei
Eu não faço ideia

Não vai ser esse hoje
Não vai ser esse agora
Porque a comida e os textos
Desandam
E queimam,
E passam do ponto
Ou estão sempre crus
Como eu, quando se trata de você.

Eu não sei cozinhar
Como sei escrever
Eu não sei amar.

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