segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Dia 1

Abrir os olhos
Praguejar
Uma noite sem sono
Figurino fajuto
Fechar os olhos
Molhar
Correndo só
Desabando nos degraus
Encolher
Dentro de si
Uma dor aflita
No âmago
Na origem do ser
Não mais querer
Pedir que pare de doer
Esmagar pulmões
O par
De apenas ar
Sem pó preto
Dentro
Só no chão
Rasgando as pernas
O espírito
Querendo ir embora
Embora
Pra fora dali
De si
Longe do copo
E o maço
Longe do cansaço
Estendida
Sobre a cama
Coberta
Ceder
Ao sol
Fugir
Morrer
Enfim
O vento
Para expor
Aviso tardio
Torpor
Vazio
Nos dedos
Nos olhos
No eco
Que deveria escorrer
Pela guela
Não sai
Silêncio
Esconder-se
No âmago
Estômago
Encolher-se
E nunca desaparecer
De si

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Carnaval

Eu não gosto da noite
Não gosto do álcool e do cigarro
Não gosto das drogas, do sexo
Das lamas de urina na rua
Do lixo amontoado nas calçadas
Não gosto de pessoas bêbadas,
Exaustas, caindo no meio da rua,
Passando pneus por cima
De outras pessoas bêbadas,
Drogadas, morrendo por dentro.
Matando o corpo.
Não gosto do escuro que doi,
Da música que força meu peito
A bater mais depressa,
Desesperar-se,
Bombeando socorro
Ao resto de mim.
Não gosto dos carros,
Guimbas de cigarros,
Não gosto do cheiro cinza
E odeio a poluição.
Não gosto de gente.
De suas toxinas predominantes,
De como me toma a onda,
Como a todos os outros,
De como sou como eles.
Não gosto da perdição.
Carpe Diem, fuga,
Autodepredação.
Não gosto do âmago alheio,
Afogado e escasso,
Não gosto da dor que sinto
Em outros olhos.
Não gosto das confissões,
Dos beijos forçados,
Dos abraços não solicitados
E a insistência fóbica dos seres.
Não gosto de ser a mãe.
De doer a dor,
De tossir doente,
De despedaçar os ossos dos pés.
Não gosto de levantar e ver o dia,
Não gosto de ser sozinha,
E não gosto de passar a noite
Ainda enxergando o mundo como é.

Sou a única no mundo que vê
O que eu vejo.
Achei que ele um dia tivesse visto,
Mas a solidão mói minha plantar
E não há nada que eu possa fazer
Eu continuo só
Mas se eu puder mudar
E nunca mais visitar esse ambiente
Eu vou tentar
Ou vou morrer
Tentando.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Matrimônio

Me casei com a depressão
E aceitei o compromisso
Agora abro a porta
Pressiono os dedos demolidos
E não grito.
O mundo é outro
Eu mando nele
Eu sou só minha
E não doi mais tanto
Ser sozinha assim.

Quando encosto meu cigarro na boca
Sou completamente louca
Mas ninguém vai me dizer
Mais quem eu sou

Sempre tentamos
Mudar quem nós amamos
Escolhi amar minha morte
E com a minha esposa
E meu amante
Eu sigo livre
Completamente eu.