segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Sopa

Eu como no escuro
Rezando pra comida errar o orifício
E eu morrer sufocada
Eu olho para o teto
Fecho meus pulmões
Seguro a tosse
Minha garganta tenta
Tirar algo de mim
Mas não consegue
Me vem o ímpeto
De enfiar
Do punho ao antebraço
Dentro de minha traqueia
Tirar aquilo de lá
Ou acalmar a coisa
Me sinto no mesmo esgoto
De novo
Como me torturasse
Masoquismo borderline
Achasse divertido
Toda essa destruição
O peso me esmaga por dentro
Viro uma sopa insossa
Tóxica
Você deveria ter ligado as luzes
Antes de me comer

domingo, 22 de dezembro de 2019

Dezessete

Eram dezoito e dezoito
O cheiro do natal chegando
A melancolia já me acenava
Pensei em você.
Nas nossas SMS em Volta Redonda
Na mesa da cozinha da minha tia
Você queria ser vlogger
Criar um canal no youtube
Eu achei tudo um lixo
Mas tentei não dizer:
Não queria arruinar seus sonhos.
Acho que você percebeu
Brigou comigo
Frustrado
Pensei
Enquanto te lembrava
Em flashes rápidos tudo
Você em festa, em texto, em call, em trauma, em relacionamento, bio no twitter, telefonema psicótico,
O meu cabelo rosa, Sasusaku, o infarto, os fundos do teatro,
O avião, e o ano inteiro decidindo se me jogava ou não nos trilhos do trem.
Pensei
Agora estou apaixonada
Por outro
Estou apaixonada
É a primeira vez em cinco anos
É a primeira vez desde março de 2015
Quando te amei
Que eu não acho que estou condenada a ti
Quis te contar
Repensei
Era como gravidez
Muito cedo dá azar
Melhor não, não
E se eu abortar?
Eu não quero ficar sozinha no mundo
Quem é que eu vou ser?
Você era o único que costumava me entender.
Acho que estou morta
Que tudo isso é uma grande peça que me estão pregando
Eu faço muita graça a algum público
Acho que já comecei a me arrepender.
Está tudo errado, tudo errado.
Eu nunca estive tão só.
E quantos mais encontro,
E quão mais perto chego,
Mais me sinto só.

Gold

Eu tropeço em água
E num sobressalto
Pedro voa para o alto
Sobe na cama
Num susto
Ofegante eu tenho
Minha primeira briga contigo
Me vejo no espelho
Acostumei aos cabelos
De carboidrato
Hidrato meu rosto
Meia noite e cinquenta e quatro
Está quase no ponto
Foram seis horas e meia
Gestando essa obra de arte
Meus dedos se abrem
Como acordados de súbito
De um silêncio profundo
De um sono de décadas
Um sonífero que passasse o efeito
Depois de descansar-me
Programada
E põe-me a escrever
Eu não tenho nome
Tudo que pra mim era um dia certo
Como as rimas
E tempo médio do poema
Se desvanece e morre
Eu não tenho futuro
E não posso fazer promessas
Tudo que tenho é essa imagem no espelho
Que no susto de Pedro
Me soou perfeitamente familiar

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Boomer

Diz pra ela que Hiroshima reergueu-se
Mesmo que o 11 de setembro
Tenha tido danos
Irrecuperáveis
Não quero que seja ela
A contabilizar os meus fracassos
Ninguém vai celebrar os meus sucessos
E a cruz que carrego
É pesada demais
Pra ser arrastada sobre mim
Como quem fosse dividir o peso
Tombando-o
Nas mais doridas de minhas vértebras
A solidão que pratico
E o ato de calar-me,
Perante todos que me novamente
Oferecem a chance
De retirar a espada de Arthur,
É também um ato de fé
O protesto célebre da morte
É o silêncio
E a severidade com que se procriam as células
É onde arde a arte
De permanecer.

Diz que venci a guerra
Que matei meus inimigos
Mas não que ganhei a mão do Príncipe
Pois disto ainda não sou digna
É preciso um reino
E terra fértil
Para prosperar

Abacaxi

Teus lábios moram nos meus
E me cobrem
Pesando o amor sobre meus olhos
Me sinto dormente, ausente
Em outra dimensão
Medindo o comprimento dos teus dedos
Na palma de minhas mãos
No silêncio da minha face
E no desmontar de minha total entrega
Aos teus olhos profundos
Que nem sempre surgem
Escorrendo entre o rio negro
Dos teus cabelos que me afogam
E à maneira como escapam teus sorrisos
Tenho vontade de ser sua
Só sua
Cada centímetro de meu corpo
Que arde sob o teu comando
Sob a tua presença
Eu sou um fio condutor
E te conduziria para o mundo inteiro
Mas antes
Quero te convidar para entrar em mim

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Bordel

Não quero discutir contigo
Filhos e netos
Planos de futuro incertos
Nas pautas frias dos teus cadernos
Quero te recitar entre meus lábios
Feito poesia
Mas que antes você me cale
Porque se alguém nos ouve
Entre sussurros
Pode ser que eu nunca mais te encontre
E eu preferia nunca me encontrar
Não quero dizer que te amo,
Pois não tenho tempo de te fazer feliz
Enquanto procuro uma saída
No meio desse furacão
Sei que meu caminho é desvioso
E não há nada de certo em minha vida
Mas as vozes me disseram pra te procurar
E quando meus olhos te encontraram
Como meus olhos moram em você
Eu fui a mais feliz do mundo
Por alguns segundos

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Sober Tiger

It's not about hiding my feelings,
I try to tell her,
Au contraire
I have no intention of relief
But to seek for a burning destruction;
What's there to be more alive
And consuming
Than fire itself?

Tiger, tiger
One might say
As my triangle finds it's peace
I try to keep up with the people
And realize
I'm not a person
Not a human being

I sew my throat
With nursed misfortune
Carrying myself
Through the drowning of my everydays
The moth cycle rewinds
I'm about to dry as a dying plant

I'm no plant either
Whatever happens it's about.