quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Eu chovo só.
Só chovo.
Sempre,
E todo dia.
E a alegria
Se escorre
No ralo da
Minha melodia
Vazia.
Sem dó,
Sem nó,
Sem pó.
Só só,
E só,
E só.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Batuque de fundo

Pensei em fumar um ou dois cigarros (ou o suficiente para que minha compulsão se interrompesse). Decidi que não. Nada sobre ser saudável ou sobre-viver. Fui atrás de Cícero. Pensei em nós. Num nós que ainda não existe. Ainda. Como se houvesse chance, como se houvesse esperança. Em metade de um mês eu já tinha criado outro mundo. E já estou em outro. E nesse, tudo desaba. Tudo desaba em silêncio. Todas as almas são fios que se arrastam, e a melodia é o que resta. A melodia das almas, como corpos que transam quietos. Calados. Como a morte que ri muda. Como a vida que chora seca. E dentro da invenção com teu nome há inspiração. E ela mente. E gira, e corre, e cai. Se joga do precipício para cair inofensiva no mar, macio. E as manhãs amanhecem, e o mundo muda. E as estrelas se escondem no mapa todo azul do futuro que não nasce. Deitei-me na cama fria, e a solidão batucava de novo, e de novo. E dançava os dedos no ar, acompanhando a medida exata de passos para não sofrer. Para não sufocar, sorria. Sorria como quem sabe das coisas que a vida não diz. E querido, há muito a ser lido entre os versos, entre os tons, entre a noite e a luz. Tudo permanece, mesmo no vazio de acordar e esperar a hora de dormir. A essência de todo o resto é a mesma. A sua essência, eu desconheço, mas as palavras se formam sozinhas. Com ele no fundo. Me dizendo sobre um caminhão de gás que vai e vem. E a morte não vem, não vem. E a dor não vem, não vem. E nada vai, e nada vai.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Não vou beber

Não vou beber
Das tuas lágrimas,
Ou do teu gozo.
Nem engolir teus medos, cega.
Nem temer-te, e à morte.

Não vou beber o meu desejo insano.
Ignorar o desespero
É tudo que eu tenho.
E sempre que eu venho retomar-me,
Já não estou.

Não saio desta vez.
Fico comigo.
Para não beber o que me mata.
Para não beber palavras vis
Daqueles que bebem,
E nos dizem para não beber.

Sóbria, a vida já não sorri
A nenhuma das almas,
A nenhum dos corpos fajutos.
Nenhum dos copos é justo.
Nenhum dos goles é bom.

Beber-te já não me é cabível.
Já não é possível me perder em ti,
E em mais nada.
Já não posso duvidar da mágoa.
Já não posso senti-la, de fato.

E não posso mais dizer que me mato,
Nem por ti,
Nem por ninguém.
Porque a morte é vã.
E nem os baldes analgésicos me salvam
Da falta de fé,
Ou da insípida necessidade de viver.

Não bebo.
Como se houvesse um amanhã.
Como se tu não tivesses existido,
Em parte alguma.
Como se eu pudesse de fato
Ser feliz com uma limonada,
Na calçada de domingo,
De manhãzinha apreciando o sol.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Saco cheio, estufado, rasgando

Aqui no meu quarto mora um silêncio insuportável.
Eu tento ligar o ventilador.
Eu tento cantarolar.
Mas não aguento mais a minha voz.
Vou para a sala,
Ligo a TV.
A TV me irrita.
E a minha família, e todos os barulhos,
E toda a companhia.
Tudo me irrita.
Enxaqueca na certa.
A luz da sala é forte demais.
Telefone,
Eles falam demais.
Aqui no meu quarto, é só silêncio.
E o silêncio é bom quando eu entro.
Depois eu odeio o silêncio,
E tudo mais.
Eu odeio acordar de manhã.
Eu odeio ir dormir de manhã.
Eu odeio ir à escola.
Eu odeio a internet.
Eu odeio as paredes,
E odeio estar fora delas.
Eu odeio o fato de o meu quarto não ter janelas.
E tenho ódio de quando faz sol.
O silêncio é a morte,
O barulho é a morte também.
Eu me alimento mal.
E me irrita o tanto que estou engordando.
Me frustra o fato de eu não gostar de exercícios.
De ter tanta, mas tanta raiva deles.
E saber que eles são uma ótima maneira
De tirar essa raiva de mim.
É isso.
O silêncio do quarto
Grita com meus pensamentos.
Pensamentos que eu não quero ter.
Não quero pensar.
Nem trocar mensagens fajutas.
Quero dormir.
Ou morrer.
Dormir.
Dormir e não precisar comer nunca mais.
Não falar com ninguém.
Definhar.
Eu não aguento mais toda essa agitação dentro de mim.
Não aguento esse estresse.
Não aguento esse tédio.
Não aguento esse desgosto por todas as coisas que existem.
Não aguento o vestibular.
Não aguento o enem.
Não aguento ficar toda hora buscando coisas para aguentar.
Não aguento esse desânimo todo.
E a rotina.
Que nojo dessa rotina.
Que nojo de ter que pesquisar sobre o descarte do lixo.
Eu devia era me descartar.
Num rio.
E deixar os peixes me devorarem.
Eu devia me matar logo,
Antes de precisar viver com isso tudo.
Que saco.
Que merda de vida.
Sem graça,
Chata,
Insuportável.
Estou cansada disso tudo.
O tempo todo.
Estou cansada.
Todos me odeiam porque eu odeio tudo.
E ninguém entende.
Ninguém entende o fato de eu odiar tudo,
E de achar tudo um saco.
Eu tinha que gostar.
Tinha que gostar de tudo, da vida.
Eu tinha que ser otimista,
E fazer o meu dever de casa.
Bom, a vida não é justa.
Nem a morte.

domingo, 19 de outubro de 2014

Balde amarelo também

Ando sempre com um cigarro na bolsa.
E ele não me traz nada.
Eu não trago nada.
Ele apenas está ali,
Na minha bolsa.
E assim estão minhas tristezas,
Meu passado,
Meus amores.
Como cigarros intocados numa caixa.
Como sapatos velhos no guarda-roupa.

Você não.
Você é objeto não tragável.
É como fogo, como luz.
Plasma, ou onda-partícula.
Você inexiste, e reflete.
Reflete o brilho da manhã,
E também a solidão da noite.
Você devolve ao mundo
Tudo o que faz sentido.
E tudo que faz bem ao espírito.

Você é as poesias que eu ainda não escrevi,
E as canções que eu não aprendi,
E as telas que eu ainda não sujei.
Do céu, me derramei de volta num balde florido.
Girassois.
Girassois por todo canto.
E amarelo,
Uma cor
Feliz.

Quem diria,
Que eu ia encontrar um jardim
Bem no meio do caos?
Quem diria,
Que ao morrer,
Eu ia ver as cores de novo?

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Elefante amarelo

Você me faz querer ser feliz pela manhã.
E quando no banho, os meus dedos se afogam nos meus cabelos cheios de xampu, você me faz querer lavar o meu umbigo.
A última coca-cola no deserto.
O último girassol na vida de concreto.
Você me faz pensar que há flores me esperando,
E que a vida é mais que dor.
Como se fosse o certo.
Você me ocupa a tarde de domingo,
E as segundas-feiras chatas.
E minhas mãos parecem pertencer mais à nossa conversa
Que aos instrumentos de laceração.
A morte parece mais sutil enquanto nos falamos.
E os dias, e as noites,
Tudo isso faz sentido.
Viver, levantar da cama.
Colorir uns papeis perdidos no armário.
E mandar cartas,
Criar coisas.
Até a tristeza parece mais bonita ao falar contigo.
Como se nem fosse tanto assim,
E nem doesse.
A tristeza parece até alegre quando eu te ouço.
E quando a gente ri.
Você me faz mais margarida, e menos pó.
Você me faz sentir sadia, e menos só.
Como se eu existisse.
Como se o mundo girasse.
Como se a depressão estivesse de ponta à cabeça.
Como se eu pudesse de fato conversar com alguém.
Alguém que fosse.
Alguém que fosse você.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Awake and warm

Quando acordei, eu percebi que ainda dormia. Que o barco tinha virado. E o disco, e a vida, e o mundo. As noites já tinham amanhecido. Os pássaros gritavam histéricos nos galhos tortos. E o sol brilhava por detrás de um frio irredutível.
Quando eu acordei, percebi que ainda havia vida pela frente. Músicas a serem ouvidas, quadros a serem pintados. Vinte e nove envelopes coloridos guardando um passado. Vi que o tempo ainda existia, apesar dos olhos vermelhos.
E estando de pé, os girassois eram mais bonitos que lâminas. Toda tinta do mundo era pouca para alcançar o amor. Valia a tentativa.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Girassol no parque

Num dia desse estávamos no parque, distraídos. De repente eu resolvi olhar pra ele e foi estranho ele estar ali. Comigo. Entende? Éramos só os dois ali. Sem mundo ao redor. Eu olhei, olhei, e não conseguia parar. Uma espécie de sentimento, uma coisa estranha em mim. Até aquele instante tudo tinha sido bom. Maravilhoso. Era estranho. Tão estranho.
Meio inesperadamente, ele acabou percebendo que eu não tava normal. E me olhou como quem não entende.
- O que houve?
Eu não sabia. Não com certeza. Mas talvez desconfiasse.
- Estou com medo.
Sussurrei. Ele não entendeu por que eu estava sussurrando.
- Do quê?
De não amar mais. Nunca mais. De nunca ser amada.
- De você.
E ele entendeu menos ainda.
- Mas o que foi que eu fiz?
- Você não me ama.
Ele não soube bem o que dizer. Não teria como. Ele não amava mesmo.
Eu simplesmente sorri e declarei:
- Eu vou embora agora, vou acordar. Tudo bem. O meu amor daqui a pouco dorme. E eu não vou precisar ficar triste.
- Mas e o medo?
- Bom. Não posso fazer nada sobre isso. O medo faz parte de mim.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Rotina, medo

Penso demais
Não como
Não durmo
Bebo
Sofro
Peço socorro
Peço socorro de novo
E de novo
E de novo
E de novo
E de novo
Tento existir
Mas, nada
Nem vírgula
Nem ponto
Fuga estática
Paralítica
Só um copo
Por favor?
Um gole só
Um passo
Um verso
Uma nota
Uma tentativa
Um traço
Porém
Por quê
A cama
E a insistência
Desesperada
A vida congelada
No caminho
O ninho de edredom e medo
E mentiras
Mentiras por toda parte

Minto
Durmo
Como
Paro de pensar
Não bebo
Não sofro
E não existo ainda
Mas finjo existir
Nada de pedir socorro
Ou de sequer querer
Nenhuma melodia
Nenhum gole seco
Nem doce
Nem uma lambida
Uma vida que segue, morta
Cega
Torta
Satisfeita

O poste

Mais uma garrafa,
Mais um copo de café.
Uma enxaqueca na alma,
E mais um ciclo
Do meu útero,
Que trabalha impiedosamente
Todo mês.

Uma melodia nova nos pulmões,
E desespero nos lençois incomodados.
Atendendo aos pedidos da solidão:
Dor, anestesia,
E tinta nas palavras mortas.
Como se morrer fosse algo bom.

Talvez se eu soubesse o que os meus fios de cabelo esperam do mundo,
Se eu soubesse a que meus poros aspiram
Na vida, de tudo.
Talvez.

Eu poderia finalmente
Fazer da minha cama
Um descanso.
E não um lar.

Talvez eu não tivesse tanto medo
Se eu soubesse realmente
Que alguma coisa existe.
Que há, que vive.
Talvez eu levasse a sério
O tanto que o sangue corre em mim.

É possível que nem tudo seja assim tão pouco,
Que a alma seja saciada.
E que esse nada
Não seja a vida, e sim falta
Não do amor em si, mas de compreendê-lo.
De enxergá-lo ali na esquina.
É, talvez seja isso.
Talvez seja culpa da esquina,
Ou do poste no meio do caminho.

(talvez seja tudo mentira, mas eu quero a minha esperança)

(mais do que a morte)