sexta-feira, 23 de abril de 2021

Corvos

Um olho gigante me observa no escuro

Arregalado, me engolindo

Colado na minha retina 

ofuscando a habilidade de se fecharem as pálpebras

Aquilo me vigia

Eu sou um mar de culpa e crimes, 

Um maremoto, 

A maresia

Eu preciso quebrar no fim da onda

Na beira, na areia

Na borda

Eu preciso quebrar.

No escuro da noite eles comem

E no silêncio da carne desmaiada

Do surdo e do mudo

Da perda de todos os sentidos

E do infinito nada do não-átomo da antimatéria 

Pulsa e pulsa e pulsa como uma maratona que pairasse entre morte e vida

E tento ter olhos para ver

Pele para sentir

Alma para existir

Tento abrir os olhos 

Mas sou um não-átomo do átomo

Do que formou o mundo e o equilíbrio da forma

Não enxergo um átimo, 

Não o percebo

Se não o reflexo dos olhos grandes elétricos 

e a fome das bestas

O tempo e o mundo, se existem, em outro plano

Eu e eles aqui e escolho o ciclo.



sábado, 10 de abril de 2021

Segredos

Tremo sob os degraus de uma possível sobriedade

Como um sanduíche de pão velho com molho de ontem à noite

É de manhã

Me invadem

Não sei de meus pensamentos

Agora estou a mil

Ando pela sala

Pelos cantos

Não sei para onde vou ou o que estou ouvindo

Estou acelerada e distante

Não estou aqui

Me invadem

Não sei das circunstâncias

Não sei se quero saber 

Queria o nada

O nada

O meu nada

Onde meus pensamentos eram a tinta

E eu era o branco

Eles me sujam

Eu tremo e

Sinto desgosto

Quero tremer em silêncio

domingo, 4 de abril de 2021

Cobras

Odeio

quando

você

finge tenta

ser 

minha

amiga

.


Assassinaram a liberdade dos meus pensamentos

Sou uma rocha em pontas despencando em giros

Quinas e saltos ao longo de um morro sem fim

Me ralo e deformo, imagem volátil, circular de mim 

Eu quero um minuto de silêncio

De paz, de alegria, de 

Não precisar ser tanto

Um descanso

Um não precisar fazer

Você sabe o quê

Você entra e me enche de veneno

E eu não sei como

Não faz sentido

Você deveria ser berço

Mas eu só vejo cobra 

Eu me cubro, um escudo improvisado

Mas não tenho para onde fugir 

Do seu abraço


Não ilha, Atlântis

 Me debruço sob o mármore da janela

Fucinho na brisa gelada, pelada

Como um cão de apartamento buscando ansioso a fuga

Uma criança enrolada em sua toalha pequena 

E o lago na sala

Eu sou uma sereia à luz do luar

Buscando o mar

Com meus cabelos molhados

E me escorre o ouro pelos dedos

É tudo tão efêmero

O ar é tão seco, para ser tão fresco

Me racha

Me humanizo

Granizo,

No lugar de chuva ou oceano

E minha cauda, minha capa

Me escondo

Do quê?

De quem?

Por que a criança chora?

E se ela bebe um copo d'água, por que

A fuga continua?

Tomo ar milhares e milhares de vezes

Incessantemente 

Afundo, âncora

Chumbo

Cidade submersa

Oceano puro