segunda-feira, 18 de junho de 2018

Strawberries

Cortei minhas garras
Para não abrir as feridas
Eu sou um bicho
E não um ser humano
Precisava de vermelho-sangue
Pra repor os nutrientes
Eu sou um bicho doente
Presa num conforto desnecessário
Me levanto como fracassasse
Devia ser bicho manso
Sou selvagem
Não sei por que abro as feridas
E rolo na lama, grama
É o que sei
Grunhir e sangrar
Feito bicho, vivo
Bicho não tenta se matar.

sábado, 16 de junho de 2018

Dor e morangos

Levantei
Com certa dormência mental
E debruçou-se em mim um peso
Desconhecido
Fazia tempo
Que a vida perdera o sentido
Mas eu queria viver.

O socorro não estava a caminho
Abrir os pulsos não adiantaria
E mesmo que eu trancasse meus lábios
Calasse as vozes todas
Que me regiam,
Não havia cura.

Eu seguiria eu.

Um peso empoeirado
Impregnado de medo
E de morte
Um par de pés
Dilacerados
Porque o asfalto
Nunca é convidativo,
Um pouco de pó
E dor
Ilhados
Numa dimensão inacabada
Nem lá nem cá
Incoerente.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Súplica

Por favor, não amarre meus pés
Eu sei que não tenho andado,
Mas não quero tornar-me mobília
Sou carne e osso,
Não madeira ou aço
Por favor,
Me deixe viver.
Sei que não tenho usado
Mãos e dedos para moldar algo novo
Ou minhas palavras para ajudar alguém
Mas não me emudeça
Não tenho um bom motivo
Para te dar
Tudo que tenho é o medo
De deixar de existir
Por favor, me deixe viver.

Eu tenho pedido
Que cesse a minha dor
Mas eu sei que não há luta ou guerra
A ser vencida
A dor é dona de mim,
E todo o meu esforço
Tem sido na tentativa de me silenciar.

Não quero curar-me de minha tristeza
É tudo que sei e tudo que sou
Sei que me afogo e quero aceitá-lo
Âncora, navio fantasma
Eu desisti de me pronunciar.

Sei que não tenho cumprido
Nenhum de meus compromissos
E não tenho pretendido mudar
Não mereço piedade ou conforto,
Não mereço um lugar no mundo
Que não este poço, mas
Me deixe existir dentro dele,
Por favor,
Não me deixe morrer.

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Árvore

Sento-me entre as raízes
Forte segue a madeira
Sugando da terra um motivo
Para viver
Despetalada aos poucos
Sob o indecifrável ritmo de ser
Ela me acolhe
Pois não tem escolha
Não fala ou reage
Não se comunica
Então me toma em seus braços
Que machucados me ardem
E em minhas costas debruçadas
Eu me afundo faminta
No solo não cabem meus dedos frágeis
Meu topo não alcança o sol
Quando murmuro algo ao vento
Na espera de ser algo além de um vegetal
Ele me silencia
E tal qual o tronco que me apaga
Eu desisto
Não há espera que cure
O anoitecer.

Toque.

Tomei tuas dores de cabeça
Como fosse curá-lo
Em milagre santo
Ou esforço
Escrevi teu nome
Impronunciável
E me amaldiçoei
Pelo amor que um dia senti
Sentei-me frente ao espelho
Tentando algo
Mas ao passo em que
Não me reconhecia
Eu não era ninguém
E as letras do teu nome
Eram indecifráveis

Te escrevi um quadro
Da minha infinda dor
Insistindo na única vida
Que conheço
Sei que não me cabe sentido
Ou alegria
Aos passos gastos
Quando te soletro
Uma canção morre.

Não é um desejo pravo
Ou mórbida aflição
É que talvez de minha honestidade
Se encurve a linha da verdade
E dos sucessos que conheço
Isto se torne queda.

Se eu tivesse sido outra
Que não coxa
Que não fúnebre e aturdida
Eu não teria um dia
Te rasgado por dentro
Eu não teria nunca te conhecido.

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Os pássaros e os pingos

Céu que ladra cinzento
Reluzindo meu medo
Não cala os sopranos intérpretes
Que não sei de beleza ou deboche
Visitam-me categoricamente
A desejar bom dia
Com suas penas ágeis
Cortam-me o espírito
E como um verso
Que finde um poema triste
Eu finco meus pés ao chão
Desejando-lhes
Mais um dia de vida

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Nutrição

Alguns dias são lentos
Morrem como nascem
Sem raiar ou pôr-se o sol
Sem horas contáveis
Ou eventos em qualquer escala
São apenas minutos
Um após o outro
Seguindo-se, qual trilhas de formigas
Buscando alimento em mim

Alguns dias
Desnutrem-se
Pois em mim não há nada

Sou um oco
Um vazio
Uma falta de vida
Ou fim.