sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Limonada

Eu tento anotar meus sonhos, meditar
Eu não tenho tempo pra te visitar
Entre provas, relatórios
Casa pra arrumar,
Eu não tenho tempo
Para ser saudável
Ou respirar,
Mas cá estamos,
De volta à vida matinal,
Acordar cedo, fazer uma limonada
Chá de hibisco, feijão vermelho,
Ficou aguada e sem açúcar,
Minha limonada
Mas eu tento de novo
Amanhã
Parar de comer carne
Estar em dia com meus compromissos
Eu tento amanhã de novo
Chegar a tempo
Nos meus compromissos
Mesmo criando novos hábitos
Gastando mais tempo
Tentando ter uma vida funcional
E mais saudável,
Se eu tiver essa sorte.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Gente, pessoa, eu.

Por um momento
Você adormece
E eu me vejo
Completamente sozinha
Mais uma vez.

Ninguém entende
O que pra mim significa
Faxinar de uma só vez
As sujeiras da minha infância.
Doi em tudo que sou,
Mas falar de dor
Já perdeu o sentido;
Então, talvez eu devesse falar
Sobre alergia,
Do cheiro de mofo e ácaro,
Poeira e álcool,
Que agora toma
O meu antigo quarto:
Impregnado de memórias antigas
E roupas fedendo a sabão em pó
Em sacos para doação;
Os brinquedos,
Que eu nem me dei ao trabalho de olhar.
Só fui jogando todos no mesmo buraco
No mesmo saco preto
De lixo.
Eu costumava sentir
Que era eu que devia ser jogada ali,
No lixo;
Mas em vez disso,
Minha infância apodrecida
Que vai.

Eu fico.

E eu adoeço,
Sozinha.
Faço meu almoço,
Sozinha.
Tomo vitamina C
E melhoro um pouco.
Tenho crise alérgica,
Sozinha.

E eu me levanto,
Escrevo um relatório
Sobre a minha paciente,
Concretizando que eu agora
Sou cuidadora,
E não um bebê frágil.

É um soco no estômago.

Eu faço listas,
Penso em como a casa precisa de uma limpeza,
Me sinto exausta,
Penso em como meu pai se sente
Tendo que morar aqui,
Sozinho.

Nada do que eu faço é suficiente,
As tralhas, as cartas,
A terapia,
Os remédios,
Que não mais me servem de consolo.
Agora sou só eu e eu.
Não tem mais personalidades
Depressão
Ou redenção.
Sou só eu.

E minha casa de infância
No condomínio
Que fatia por fatia,
Vai me deixando pra trás,
Vai me abandonando
Pra morrer.

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Vocação

Não existe mais tempo
Para um romance
Ou livro de poesias.
Não há mais dinheiro,
Crédito em conta no banco
Ou serviço a ser feito
Para ganhá-lo,
E assim, financiar
O romance
Ou as poesias.
A arte, desde que sei
Tem custado o suor e dor
De quem trabalha
Para em sua classe média
Sustentar
Um breve momento de apreço
Pelo vazio perpétuo
Cravado
No ponto cego
Do dentro.
Não existem mais maneiras
De se fazer arte
Sem demandar dinheiro
Ou tempo
Ou a própria vida:
Lágrimas e sangue sob a cova.
Não existe mais esperança
Para nós
Do submundo:
Os sub-humanos,
Filhos frutos
De dinheiro e dor.

Fé, 5am

The sky is a shading purple
The city ain't awake yet
This is the most familiar feeling
The movement of my right hand
When it scratches my neck
The feeling that you've experienced something
No one else did
And therefore,
Will never be able to understand.
There is some sort of beauty in this pain
The loneliness of being one
And only one self
Realizing that it's gonna be it
For the rest of your life.
Everything you feel
And everything you taste
And everything you see
Will be a quick breath.
In a matter of seconds
Will no longer exist.
Anything is but a thought
Inside your confused mind.

But then I walk through the kitchen
Of this so said house
I go through the hall,
Take a peek on the living room,
Scale the stair into your bedroom,
And slowly slide into your your blanket.
It feels warm and soft
Inside your chest, so
I deep breath
And let my shoulders down
And fall asleep.

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Alone at house one

Bunny gosta da chupeta de coelhinho que brilha no escuro.
E de uvas verdes sem caroço. E do desodorante que tem cheiro de bala de morango.
E do senhor T.
Patrícia gosta da ideia de morar em sua própria casa.
Alice odeia os insetos. Tem algumas lembranças boas, mas não aparece muito porque a casa a deixa confusa. Não é mais um lugar que ela reconheça. Está estranho. Não é mais como foi antigamente.
Lola brinca com o corpo de T. aproveitando a intimidade que ele e Bunny têm. Acariciá-lo é mais confortável e seguro que deixar que Nadine desabe no sofá da sala ou nas cobertas frias.
Nadine sente calor. Um calor insuportável. Faz quarenta graus em todos os cantos e ela só se acalma em frente ao ar condicionado que no corpo provoca alergia. Nadine odeia a vida. Finge que odeia T; mas ele é sua única saída.
Encontramos uma carta nossa na gaveta do pai.
Uns querem roubar. Outros querem pôr fogo. Fingir que nunca aconteceu. Alguém recomenda que falemos sobre isso. Com quem? Quem iria entender? Nos sentimos sozinhos.

Eu me sinto sozinha.
A dor mora em mim, e eu tenho sobrevivido.
Melhor contigo, mas,
Ainda doi.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Manguinhos

Minha pele descama
Eu sou uma lagarta
Em sua segunda semana de vida
Meu cabelo solta pó
Eu sou um móvel empoeirado
Estou seca demais
Para a chuva que cai lá fora
Estou morta demais
Para manter meus olhos abertos.

Não sinto sono
Ou fome.
Percebo coisas ruins.
Desesperança.
Segunda-feira.

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Chá Preto

O dia hoje parou.
Como um músculo cardíaco
Que esquecesse de mover-se,
Silenciou, calou-se,
Em obscuro protesto,
Morreu.
O céu amornou-se
Absteve-se de me gelar os ossos
Ou fritar-me a pele
Como um chá
Que tem que ser bebido quente
E engolido em uma única
E grande dose,
Sem respirar.
Em respeito à minha dor
Os pássaros não cantaram,
Meus pés não fraquejaram,
Lacunas e mais lacunas de tempo
Formaram-se
Para que meu dia queimasse
Mais depressa,
Teia tecida em atalho,
Pavio da vela
Que esqueci-me ontem de acender.
Hoje eu não tomei três doses de veneno
Na esperança de morrer.