domingo, 10 de novembro de 2013

Um dia (in)útil.

   Me encontro com ela pela manhã. Cinco malditos dias na semana são assim. Meus olhos a perseguem, mas ela os evita quase sempre, e isso é tremendamente incômodo. Especialmente considerando todas as vezes em que os olhares dela eram só meus... Como se não houvesse mais ninguém ali conosco. Apenas eu e ela, e seus olhares pervertidos só pra mim. Ela me evita, e de alguma forma me enfurece não ser mais suficiente. Conheço bem o que é certo, mas ela está ali, me provocando. Mesmo quando não me olha. Eu sei o que ela está fazendo, e que ela nunca deixa de notar minha presença, assim como nunca deixa de agir como se eu não existisse. Pisa em mim.

    - Bom dia!
    - Bom dia.
    Sorrio ao responder numa tentativa fracassada de reaproximação. Ela sorri de volta um sorriso falso. Quase assassino. Não sem demonstrar sua simpatia venenosa. E só me faz querer estar ali com ela de novo. Não posso, nenhuma das duas permitiria. É torturante.
    Se senta ao lado dele. Não é novidade a facilidade dela para se ‘doar’ a alguém, ou a sua necessidade de aparentar intensamente libidinosa.  Recosta nele. Eles estão tão perto... Ela resolve interagir. Fala comigo, sentada no colo dele. E todas as reações dela enquanto ele a aperta. Os olhares... Eu conheço tudo. Ela nunca foi minha, na verdade. Posso sentir na minha coxa o peso dela que ele sustenta agora. Ela sorri. Sorri como sorria nos quartos comigo. E em qualquer outro lugar em que estivéssemos a sós. Ela sempre teve esse dom de convencer a lealdade inquestionável apenas com o olhar.
    Me olha como se fosse minha, o olha como se fosse dele. E se exibe aos dois ao mesmo tempo. Deixa incomodamente explícito o que ela faria se não houvesse mais gente por ali. Sua boca, suas coxas, suas unhas. Seu corpo conversa com a gente e não nega muito do que diz a sua voz. Gargalha e modela sua farsa, tão fácil de segurar nas mãos quanto água.
   Foge com ele ou sozinha... Uma borboleta negra dançando dócil e fatal. Mais um dia de semana cansativo. Mais um dia sem ela. Mais um dia só.

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