sexta-feira, 22 de julho de 2016

Asa.

Sempre que eu pego um avião
Há algo que me rouba a identidade
Quando decolo, me perco nos ares
Juro que é verdade
Eu me esqueço de quem era
Em outro chão
Não sou mais ela
Quem dera
Não mais ser quem serei
Quando pisar de novo
Ausente de náuseas ou tosses
Plena de noites de sono
Que nunca terminam
Quando viajo
Quando saio de minha terra
De minha cama
De minhas esquinas e gentes
Recebo um presente
A mudança súbita dos dias
E a melancolia é só minha
Tenho paz
E quando eufórica pulo
Agradeço aos deuses
Pelo pouco que me agrada
Não tarda
Volto a me sentir exausta
Fugir incansavelmente
Na realidade cansa
É duro não ser
Mas também é preciso respirar
Então quando tomo fôlego
E me vejo no ar
Nuvens estiradas abaixo de mim
Eu sei que estou no fim
De tudo que sou
E quando acordo
Me doi um vazio agudo
Que aquece,
Como um tiro que saiu
Na cirurgia precisa
Da aterrissagem
Esta imagem
Que antes conhecia
É uma cicatriz
E o pássaro triste
Que antes ali havia
Se sofria
Agora morre
Deixa uma canção monótona
E segue um estardalhaço de cores
Outras asas
Alguém para nascer de novo
Um ovo esquecido
Chocado pelo sol
Para voar de volta
E morrer na queda
Para voltar a ser quem antes fui

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