quinta-feira, 7 de julho de 2016

Se eu nunca te tivesse tocado

Os textos que te copio são meus.
Minha caligrafia, narração,
Minha respiração sobre os versos
Inversos aos que tu escreveu.
São meus.
O tom de voz rouco, desafinado,
O descompasso desesperado
E o apego desmedido.
Meus.
Os textos que te roubo,
Quando não mais expostos no teu mural,
Quando não te escorrendo sangue sob a pele,
Vendidos abaixo do preço de mercado,
Não são mais teus.
Rabisco meu nome em cima.
Tomo posse, contamino.
Corrijo um ou dois erros,
Olha só esse descaso nada novo...
Em minha tipologia e margem,
Cor e formatação.
Os textos teus que recito em meu diário
Apenas meus são.
Não por você tê-los me doado,
Como o fez tantas e tantas vezes.
Não por você ter me endereçado,
Nome, sobrenome e apelido,
Piada interna, descrição de mim.
Os textos que te copio,
Fiel, como a matéria na lousa da escola,
São meus.
Escolho as minhas pausas,
Arrogante e suja.
A minha ordem estraga
A perfeição da tua bagunça.
E a minha limpeza
Arranca
As dores e os tremores,
Calafrios sóbrios
Que teria ao reler-te mais uma vez.
Os textos teus
Na minha voz maldita
Só revelam a imensidão
Da minha escassez.
Copio um trecho,
Decoro.
Melodia solta
No meu velório.
Faço trilha sonora
Monótona
De todos os segredos
Absurdos
Que me tornam
Um breve pedaço gordo de derrota
Ou algo que tenha origem
Num lugar ruim.
Tento mais uma vez.
A fala, a poesia.
O ritmo, penso:
Como você faria?
Mas erro,
Porque desde o começo
Teus textos
Não foram feitos pra sair de mim.
Te peço uma vez,
Desisto.
Talvez não por princípio,
Por negligência mesmo,
Assim eu sou.
Prepotente, no mínimo,
Megalomaníaca.
E se tem algo no mundo
Que eu não posso tocar
Sem que toda beleza seja
Drenada
Pela minha sede incansável
De consumir tudo que alcanço,
Este algo, pode-se de dizer,
É o todo que sai de ti.
Uma vez que tu és tu,
E produz textos,
Não importa
A quem estejam endereçados,
Eles são teus
E só serão, se forem teus.
Em minhas mãos,
Carregadas de mortes, desgraças,
Autopiedade ou sabotagem,
São só restos mortais, resquícios
De toda a beleza que o mundo
Poderia ter tido.
Em minhas mãos, não são.
E através de minha voz,
Tu nunca serás tu.
Nunca teria chance.
Não adianta
Quantas vezes eu implore
Que me deixes guardar fatia
De uma estrela.
Quando chega em mim,
Você morre.
Torna-se um mantra satânico,
Fora de tom,
Esquecido na poluição que sou.
Torna-te algo
Que nunca mais tu.

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