sábado, 14 de setembro de 2013

Ruborescer

   Ela estava anormalmente magra. Só um sentimento podia ser visto em seus olhos, e este era fúria. Ela entrou em casa com a mesma atitude de sempre, mas o ar estava um pouco mais pesado. A porta tremeu assustada quando ela entrou. Por alguma razão que ele não entendeu, ela rasgou as próprias roupas. Estava suja, e ele não fazia ideia do que poderia ser aquela mistura escura que cobria algumas partes de sua pele. Sua estranha magreza não a tornava mais bonita. Talvez a fúria fosse fome. Teria ela optado pela anorexia? O aspecto do corpo dela era bizarro, realmente. Talvez fosse cocaína... Ela teria culpado a falta de sexo, se tivesse dito algo. Mas ela não disse. Apenas invadiu o espaço dele e começou a quebrar tudo que via pela frente.
  - O que você pensa que está fazendo?
   Contagiado como sempre pelos sentimentos tão nobres daquela moça que valia tanto a pena, ele decidiu que dessa vez ela tinha passado dos limites. Tentou segurar seus pulsos para que ela parasse de quebrar as coisas. Ela imediatamente se jogou no chão e puxou as pernas dele com tamanha violência que ele sentiu-se tonto ao cair no chão. Não satisfeita ela o puxou pelas pernas e de alguma forma derrubou sobre seus pés a cômoda, o prendendo ao chão. Ainda quebrava coisas ao redor dele. Ele ainda não sentia medo, mas uma fúria imensa e contagiosa, e a dor só fez aumentá-la. Ela provavelmente tinha quebrado todos os dedos de seus pés.
  - Puta. Você tá me ouvindo?! PU-TA! - urrou.
   Ela voltou novamente sua atenção selvagem a ele, e o olhou esperando que ele voltasse ao seu lugar de obediência e submissão. Não funcionou. Ele estava realmente furioso, e isso a irritava ainda mais. Mas estava pra piorar. Assim que ela abaixou, ele deferiu-lhe um tapa no meio da fuça. Ele sabia... Sabia que não deveria fazer esse tipo de coisa. ELE SABIA!
   - Você não...
   Não terminou a frase. O ódio a sufocava. Atingia agora o estágio da Ira. Sumiu.
   Voltou da cozinha com a maior e mais amolada faca que tinha encontrado lá. Ela mesma a tinha comprado. Ele insistentemente ainda não sentia medo. Teimosia a ela era algo desprezível. E ai de quem a associasse a tal defeito. Mirou dois dedos acima do umbigo descoberto dele. Ele tentou impedir, mas ela desceu os braços com tanta força que o que estava na frente foi cortado também. Enquanto os joelhos dela se chocavam brutalmente contra o chão, dois cortes profundos foram feitos, uma na palma da mão dele e outro no antebraço. Uma poça de sangue rapidamente se formou ao redor da faca mergulhada na altura de seu estômago.
   Em pouco tempo ele tossia sangue, e ela repetia a dose freneticamente. Os cabelos cobrindo seu rosto, mergulhados entre os órgãos recém-dilacerados dele. Seu olhar já era vazio de sanidade no momento em que ela pisara na casa. Agora seus olhos não podiam mais ser vistos. Ela era apenas um contorno animalesco lambendo uma bela faca e sua mão ensanguentada. Um cadáver rubro e afogado no chão a seu lado. Nenhum sinal de vida humana por ali.

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